No ECoMAR, nossa equipe de pesquisa segue de perto essas gigantes do oceano. Com um método preciso e gentil, coletamos apenas um pedacinho de pele e gordura bem pequeno, de aproximadamente 2 cm, para descobrir informações preciosas sobre sua saúde e trajetória de vida.
O que é biópsia em cetáceos?
A biópsia em cetáceos, ou seja, baleias e golfinhos, é uma técnica pouco invasiva para coletar uma pequena amostra de pele e gordura . Geralmente, os pesquisadores usam um equipamento especial — por exemplo, uma balestra — que dispara um dardo com uma ponteira acoplada. Essa ponteira adaptada para baleias e golfinhos, remove uma amostra de tecido do animal enquanto ele nada livremente no oceano. O procedimento é rápido e preciso. Comparando o tamanho de uma baleia com a amostra removido, é como uma injeção com uma fina agulha. Estudos científicos demonstram que a maioria dos animais não reage ao procedimento, enquanto alguns outros reagem rapidamente como se tivesse levado um susto. E o mais importante é que o animal permanece solto na água o tempo todo, sem necessidade de redes ou contenção.
Por que coletar tecido desses animais?
Coletar biópsias de baleias e golfinhos é importante porque cada pedacinho de tecido carrega uma grande quantidade de informação científica. Através dele, podemos aprender sobre:
Saúde e contaminação: O tecido mostra se o animal possui metais pesados, pesticidas ou outros poluentes acumulados. Por exemplo, cientistas detectam níveis de mercúrio e de PCBs (poluentes industriais) que indicam o grau de poluição no ambiente marinho.
Genética e identificação: Com o DNA da amostra, é possível descobrir se o animal é macho ou fêmea, seu parentesco e linhagem familiar. Assim, descobrimos se duas baleias vistas em locais diferentes são parentes ou até mesmo mãe e filhote, ajudando a entender como as populações estão estruturadas.
Dieta e ecologia alimentar: A pele retém indicadores do que o animal comeu, pelas análises de isótopos estáveis ou ácidos graxos. Isso permite saber se a baleia se alimenta de krill, peixes ou lulas, por exemplo, ajudando a montar a teia alimentar do oceano.
Dosagem hormonal: A amostra pode revelar hormônios que indicam se a fêmea está grávida ou não, assim como a presença de hormônios indicativos de estresse, como o cortisol. Tais informações também ajudam a entender a saúde desses indivíduos.
Cada amostra funciona como um relatório de saúde individual, fundamental para entender e proteger as espécies. Essas informações só são possíveis por métodos não letais, minimamente invasivos como a biópsia, que coleta de forma segura dados que antes eram inacessíveis.
Coleta rápida, segura e indolor
A biópsia é muito mais delicada do que imaginamos. Estudos científicos mostram que a reação dos animais é iminentemente curta e suave. Em geral, ao receber o dardo, o cetáceo pode dar uma “sacudidela” sutil ou um breve mergulho instantâneo, e em seguida retoma o comportamento normal em menos de um minuto. Pesquisas internacionais relatam que muitas vezes as baleias nem sequer demonstram reação. Em testes com orcas na Antártida, 66% das tentativas de biópsia sequer fizeram o animal mudar o comportamento. Quando houve impacto, foi quase imperceptível – uma contração rápida ou mergulho – e nunca se observou reação forte ou prolongada. Ou seja, não há feridas abertas nem sofrimento detectável (Leia o trabalho clicando aqui)
Como esses dados ajudam na conservação
As informações obtidas são fundamentais para conservar as espécies. Ao analisar o DNA, saúde e dieta dos cetáceos, podemos mapear como as populações estão se saindo no ambiente. Por exemplo, saber que uma população de baleias possui alto nível de determinados poluentes pode levar órgãos ambientais a investigar fontes de contaminação naquela região. Se descobrimos que um grupo de golfinhos está geneticamente isolado, podemos propor rotas marinhas seguras ou áreas protegidas para ligar populações.
Além disso, dados de dieta ajudam pesquisadores a entenderem quais peixes sustentam a vida marinha e se a pesca humana está afetando a alimentação natural desses animais. Informações de reprodução (via hormônios) indicam se há fêmeas grávidas suficientes para manter a população ou se ela está em risco de queda. Tudo isso dá subsídio a políticas públicas e acordos internacionais de proteção marinha.
Protocolos éticos e rigorosos
É natural se preocupar com o bem-estar dos animais. Por isso, a biópsia de cetáceos só é realizada dentro de padrões éticos muito rigorosos. Todas as coletas são feitas por pesquisadores experientes e treinados, seguindo protocolos internacionais de segurança. Antes de entrar no mar, a equipe possui licenças especiais (no Brasil, por exemplo, do IBAMA ou ICMBio) que autorizam a pesquisa sob condições estritas.
No campo, são observadas regras claras: manter distância segura das baleias, só disparar quando as condições estiverem ideais (animal nadando em paralelo e a uma distância segura da embarcação), e interromper a tentativa se o grupo mostrar sinais de estresse.
Assim, todos os aspectos do estudo – da abordagem até o processamento da amostra em laboratório – são feitos sob supervisão científica e ética. O resultado é uma coleta de tecido que respeita os animais: livre, breve e indolor, em prol de um conhecimento maior.
Conclusão
A biópsia em cetáceos revela como a ciência marinha pode ser cuidadosa e impressionante ao mesmo tempo. Com apenas um pequeno fragmento de pele e gordura, aprendemos sobre a vida íntima das baleias e golfinhos – desde seu cardápio até seu estado de saúde — sem prejudicá-los. Esses achados ajudam a proteger nossos gigantes marinhos e a manter os oceanos mais saudáveis para todos. Cada descoberta científica nos inspira a valorizar e conservar esses magníficos moradores do oceano, mostrando que a pesquisa bem-feita é uma aliada poderosa da natureza.
Referência complementar: